Análise do Poema "Ulisses"
O mito é o nada que é tudo.
O mesmo sol que abre os céus
É um mito brilhante e mudo --
O corpo morto de Deus,
Vivo e desnudo.
Este, que aqui aportou,
Foi por não ser existindo.
Sem existir nos bastou.
Por não ter vindo foi vindo
E nos criou.
Assim a lenda se escorre
A entrar na realidade,
E a fecundá-la decorre.
Em baixo, a vida, metade
De nada, morre.
Reflexão:
Ulisses, o herói da guerra de Tróia e protagonista da obra odisseia de Hómero, é um dos grandes mitos da civilização grega, e segundo a lenda, terá fundado Lisboa. Ao recuperar esta lenda e elege-lo como um dos primeiros poemas da “Mensagem”, Fernando pessoa tem precisamente a intenção de atribuir a Portugal uma origem mítica, que é mais valiosa de que qualquer origem histórica (os heróis desta obra são localizadas sobretudo no seu lado mítico).
Tal como na “Mensagem”, Camões recupera nos Lusíadas a lenda de que Ulisses terá fundando Lisboa.
Análise do Poema "D. Afonso Henriques"
Pai, foste cavaleiro.
Hoje a vigília é nossa.
Dá-nos o exemplo inteiro
E a tua inteira força!
Dá, contra a hora em que, errada,
Novos infiéis vençam,
A bênção como espada,
A espada como bênção!
Reflexão:
Este poema apresenta-se como uma prece dirigida a D. Afonso Henriques, “Pai” de uma geração que lendariamente recebeu a força e a missão de Deus. O sujeito poético, assumindo-se como voz do colectivo português, pede ao Rei-Rei que dê ao seu povo o exemplo, a força e a bênção, porque “Hoje a vigília é nossa”, somos nós que temos que ser cavaleiros contra “novos infiéis”, fantasmas do adormecimento colectivo.
Análise do Poema "D. Sebastião Rei de Portugal"
Louco, sim, louco, porque quis grandeza
Qual a Sorte a não dá.
Não coube em mim minha certeza;
Por isso onde o areal está
Ficou meu ser que houve, não o que há.
Minha loucura, outros que me a tomem
Com o que nela ia.
Sem a loucura que é o homem
Mais que a besta sadia,
Cadáver adiado que procria?
Reflexão:
Comparação “Os Lusíadas”/ “Mensagem”, é a D. Sebastião que Camões dedica “Os Lusíadas” e é a este Rei que o poeta dirige o apelo no sentido de continuar a tradição dos antigos heróis portugueses, para fazer ressurgir a pátria da “apagada e vil tristeza” do presente.
Na “Mensagem”, D. Sebastião (e o sebastianismo) é o mito organizador de toda a obra, no sentido de que o rei representa o sonho que ressurgirá do nevoeiro em que o Portugal presente está mergulhado, impulsionado a construção do Futuro.
Análise do Poema "O Infante"
Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, já não separasse.
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,
E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.
Quem te sagrou criou-te português.
Do mar e nós em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!
Reflexão:
Este poema (“O infante”) foi criado para estabelecer uma relação passado/presente/futuro. Deus quis que os portugueses sonhassem o desvendamento do mar, fazendo nascer a obra dos descobrimentos.
Os portugueses no passado cumpriram, a missão divina, desvendando os mares desconhecidos e criando o Império. Mas este desfez-se e, no presente, Portugal é uma pátria sem glória que falta “cumprir-se” daí o apelo profético expresso no último verso exclamativo, ao cumprimento do destino mítico do Portugal.